quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Colisões - Perigo radioativo no céu e no mar

Colisão de satélites revela crises espaciais

“A colisão Iridium x Cosmos, que gerou tanto lixo e pode gerar muito mais ainda através do “efeito cascata”, não pode prescindir de uma análise mais consistente e eficaz”

Já se conseguiu evitar grande número de choques entre objetos espaciais e peças do imenso lixo hoje existente nas principais órbitas usadas em serviços de utilidade pública. Por que o satélite americano de comunicação Iridium não logrou se desviar do satélite militar russo Cosmos, já em desuso, no dia 10 de fevereiro passado? E por que o Cosmos continuava em órbita, se já não funcionava? São questões à espera de respostas.

Mas a inusitada colisão tem implicações bem maiores. Envolve sérias dificuldades políticas, que vêm causando grave paralisia jurídico-internacional. É um quadro perturbador praticamente desconhecido, que, no entanto, deveria merecer especial atenção da opinião pública global.

Três são os problemas em jogo, que julgo mais críticos:

1) O aumento vertiginoso do lixão espacial, para ser enfrentado com o devido vigor, exige medidas de bem mais eficazes que os paliativos propostos até hoje. O Comitê das Nações Unidas para o Uso Pacífico do Espaço Cósmico (Copuos), criado em 1959 para avaliar e regulamentar as atividades espaciais, aprovou, no início de 2007, uma série de diretrizes para orientar os países no tratamento voluntário do lixão espacial, adotada pelo Subcomitê Técnico-Científico, após anos de debates.

Tais normas, logicamente, deveriam ter passado pelo crivo do Subcomitê Jurídico, para ganharem o necessário peso legal, dada a gravidade da situação nas órbitas mais utilizadas. Mas a área jurídica foi mantida à margem e não teve chance de apreciar a matéria.

O fato ilustra uma das crises do Copuos: certas potências espaciais preferem normas técnicas, de cumprimento voluntário, a normas jurídicas, que sempre têm maior autoridade política, mesmo quando não obrigatórias. Troca-se o político-jurídico pelo apenas técnico, o que muda a competência básica do Copuos.

Algo similar ocorre no âmbito do Direito Internacional Público: a produção de tratados multilaterais perdeu o ímpeto dos anos 60 e 70, por exemplo. O Brasil, unido aos países da América Latina, da Europa e de outros continentes, poderia defender a inclusão do tema dos dejetos espaciais na agenda do Subcomitê Jurídico do Copuos, que se reunirá de 23 de março a 3 de abril, em Viena, Áustria.

A colisão Iridium x Cosmos, que gerou tanto lixo e pode gerar muito mais ainda através do “efeito cascata”, trombando com o monturo já existente, justamente nas órbitas de maior frequencia, não pode prescindir de uma análise mais consistente e eficaz.

2) Torna-se mais e mais necessária a criação de um Sistema Global de Controle das Atividades Espaciais, que permita saber a cada instante, como ocorre hoje no tráfego aéreo, onde e como está cada satélite lançado ao espaço, suas coordenadas exatas, seu estado de funcionamento, a situação real de seus principais equipamentos, a quantidade disponível de combustível, o nível de controle exercido sobre ele pela respectiva estação terrestre e outros dados essenciais.

A ideia vem sendo discutida há vários anos pela Academia Internacional de Astronáutica, Instituto Internacional de Direito Espacial e outras organizações nacionais e internacionais de pesquisas em C&T espacial, mas ainda não logrou sensibilizar os governos e empresas que lideram as atividades espaciais. Ante tal crise, a França propôs no Subcomitê Jurídico do Copuos o exame da “sustentabilidade das atividades espaciais”, que poderá abarcar os temas do lixão espacial, da segurança das atividades espaciais e da não instalação de armas no espaço, pois isso levaria à sua conversão em virtual teatro de guerra e possível fonte de lixões incontroláveis, bem como de consequentes apagões espaciais. Cabe ao Brasil apoiar e, se necessário, ampliar a iniciativa francesa.

3) É preciso acionar a Convenção sobre Responsabilidade Internacional dos Estados pelos Danos Causados por Objetos Espaciais, em vigor desde 1972, que, em seu Artigo 3º, responsabiliza o país cujo objeto espacial causou dano a um objeto espacial de outro país “em local fora da superfície da Terra”, ou seja, no espaço, “se o dano decorrer de culpa sua ou de pessoas pelas quais for responsável”.

Cabe perguntar: a colisão teve um culpado? A conduta concreta e objetiva de quem dirige os objetos espaciais a partir de sua estação na Terra deve ser reconstituída para se ter clareza sobre o encadeamento causa-efeito no acidente. Voltamos, assim, à pergunta inicial. Mas agora destacando um primeiro indício relevante: o satélite Cosmos, deixado ao léu após seu ciclo de vida útil, parece que voava sem controle, ao contrário do Iridium, que permanecia controlado.

A Rússia, então, poderia ser considerada culpada por não retirar de circulação o falecido Cosmos, lançado nos idos de 1993, hoje objeto em desuso e já sem controle, em órbita tão povoada.

Já os Estados Unidos poderiam ter certa culpa, na medida em que as pessoas incumbidas de dirigir o Iridium não foram capazes de desviá-lo da rota de colisão. Um choque entre dois culpados? Sim e não. Creio que, no caso, a culpa da Rússia é bem maior que a dos Estados Unidos. Mas como condenar a Rússia por abandonar no espaço um satélite inútil, que, por si mesmo, já é um enorme dejeto espacial de 950 kg, se o Direito Espacial ainda não obriga legalmente os países a conduzirem tais objetos, em derradeira manobra, às chamadas “órbitas cemitério” ou à reentrada na atmosfera para ali se diluírem?

E como convencer as potências espaciais, que sistematicamente recusam qualquer projeto de atualização dos tratados espaciais firmados há mais de 30 anos, e de criação de novos acordos para regulamentar os mais recentes rumos das atividades espaciais? Esta é outra crise com que nos defrontamos numa área que se tornou mais estratégica do que durante toda a Guerra Fria. O desafio, portanto, é mover-se num espaço de contínuas crises imobilizantes.

José Monserrat Filho é professor de Direito Espacial, Vice-Presidente da Associação Brasileira de Direito Aeronáutico e Espacial (SBDA), membro da Diretoria do Instituto Internacional de Direito Espacial, membro efetivo da Academia Internacional de Astronáutica, membro do Comitê Espacial da International Law Association (ILA), e, atualmente, chefe da Assessoria de Assuntos Internacionais do Ministério da Ciência e Tecnologia.

Jornal da Ciência

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Europeus fazem simulação de 'tráfego intenso' de satélites no espaço

Cerca de 12 mil objetos giram ao redor do planeta atualmente.
Imagens da ESA (Agência Espacial Européia) ajudam a entender colisão.


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Imagem da Agência Espacial Européia mostra como é o 'congestionamento' de satélites em órbita (Foto: ESA/AFP)

As imagens impressionam. São parte de uma simulação da ESA (Agência Espacial Européia) para mostrar onde estão os mais de 12 mil satélites artificiais da Terra, colocados em órbita por foguetes nos últimos 50 anos. Olhando para elas, fica mais fácil entender como, apesar de todo o esforço de rastreio feito por agências espaciais ao redor do mundo, dois satélites, um russo e um americano, colidiram no espaço, sobre a Sibéria.


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Em órbitas mais distantes, o tráfego também é intenso (Foto: ESA/AFP)

Nas imagens, há um exagero, claro: os satélites na verdade são bem menores do que parecem na simulação, em comparação com o tamanho da Terra. Por isso, ao tirar fotos de nosso planeta, as sondas espaciais não revelam a montanha de metal, lixo e painéis fotovoltaicos que gira o tempo todo sobre nossas cabeças. Ainda assim, está tudo lá.

As preocupações de segurança são maiores para missões tripuladas. Em caso de uma colisão de algum desses satélites com a Estação Espacial Internacional, é improvável que os tripulantes do complexo orbital pudessem sobreviver. Daí a necessidade de monitorar de perto tudo que é colocado em órbita da Terra.

G1

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Falta de comunicação é a provável causa da colisão entre dois submarinos no Atlântico


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De acordo com uma entrevista dada à revista Time por um veterano comandante britânico, a recente colisão entre o submarino nuclear francês Le Triomphant e o submarino nuclear HMS Vanguard da Grã-Bretanha no Atlântico Norte, pode estar relacionada com a falta de comunicação entre a Marinha da França e as forças navais integrantes da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte).

Segundo Julian Ferguson, veterano aposentado em 2006 que comandou um dos quatro submarinos nucleares da Classe Vanguard da Royal Navy, o acidente aconteceu provavelmente porque um não tinha conhecimento da presença do outro, embora os dois estivessem navegando na mesma área.

A OTAN opera um sistema de controle de tráfego que alerta as nações aliadas sobre a presença de submarinos amigos. O sistema é projetado exatamente para evitar colisões. Entretanto, a França não faz parte do comando militar da OTAN e não recebe nem emite essas informações.

A Marinha francesa confirmou que não revela as posições dos seus submarinos nucleares armados com mísseis estratégicos. "A França não fornece todas as informações sobre a posição dos seus armamentos nucleares ou submarinos transportando armas dessa natureza, porque consideramos nosso arsenal nuclear um elemento vital de nossa capacidade de defesa", disse Jérôme Erulin, porta-voz da Marinha da França, à revista.

Fontes oficiais ouvidas pela Time disseram que a França não está sozinha em reter informações sobre os submarinos nucleares armados. Britânicos e estadunidenses também mantém sigilo sobre a localização de suas armas de dissuasão estratégica. Um porta-voz da OTAN, afirmou: "A França utiliza os mesmos procedimentos adotados pelos membros da aliança atlântica no que diz respeito à sua frota submarina". Mas, por outro lado, Julian Ferguson diz que os franceses são particularmente “secretistas” devido à sua posição de não participante da OTAN.

No passado já houve discussões motivadas pela preocupação com a falta de comunicação entre as forças navais dos dois países. Em 1994, a Grã-Bretanha e a França debateram uma cooperação mais estreita entre as suas forças navais e um possível estabelecimento de áreas de patrulhamento para seus submarinos nucleares. O processo de discussões foi até setembro de 2000 e as disposições foram formalizadas num acordo bilateral de cooperação na área de defesa. Esse acordo prevê uma troca de visitas regulares de submarinos armados entre os dois países e intercâmbios sobre a política nuclear. Mas não está claro se isso inclui a troca de informações sobre posicionamento de submarinos nucleares armados e muitos especialistas dizem que não. "O fato de que a colisão ocorreu indica que os dois aliados têm de se comunicar mais", afirma Hans Kristensen, especialista da Federação de Cientistas Americanos em assuntos da OTAN.

Segundo Ferguson, embora o cruzamento muito próximo de dois submarinos nucleares equipados com sonar em um vasto oceano pode parecer improvável, mesmo sem trocas de comunicações, existem anomalias ambientais no Atlântico que fazem uma colisão ser um evento mais provável do que se pensa. Submarinos em missão de dissuasão, por exemplo, tendem a se posicionar em lugares onde é pouco provável que sejam encontrados por outros submarinos e aviões de reconhecimento. Existem fatores oceanográficos nesses “esconderijos” em alto-mar, como por exemplo, diferenças acentuadas de temperaturas e correntes marinhas locais, que podem interferir na eficácia do sonar e a presença de outro submarino não ser percebida a tempo para que a ação de evasiva seja executada para se evitar uma colisão, explica Ferguson.

"As ogivas nucleares múltiplas que o submarino francês e o britânico transportavam não correram o risco de detonação por ação da colisão", disse Ferguson. Mas o grande perigo ficou por conta de um provável dano aos reatores nucleares das duas embarcações, cujas conseqüências poderiam ser o envenenamento da tripulação e disseminação dos resíduos radioativos por milhas sobre o Oceano Atlântico.

A colisão poderia ter sido evitada por força de uma melhor comunicação entre a França e a OTAN e a revelação da ocorrência veio em um momento politicamente sensível. A França está em vias de voltar a participar da infra-estrutura militar da OTAN a partir de abril. Essa política francesa de sigilo sobre a localização de sua frota de submarinos nucleares será alvo de pressões antes que a reintegração aconteça, especialmente porque os franceses já informaram que não estão dispostos a mudar de posição sobre a questão.

Tecnologia & Defesa

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